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AGÊNCIA CBIC

06/04/2021

Nova lei de licitações representa um retrocesso, analisam CBIC e Apeop  

A nova lei de licitações representa muito mais que um retrocesso e, longe de evitar as causas que geram corrupção, deverá provocar maior insegurança jurídica. É o que defende o presidente da Comissão de Infraestrutura da Câmara Brasileira da Industria da Construção (Coinfra/CBIC) e da Associação para o Progresso de Empresas de Obras de Infraestrutura Social e Logística (Apeop), Carlos Eduardo Lima Jorge, em entrevista publicada nesta terça-feira (06/04) na ‘Modal – Revista de Infraestrutura & Logística’.

“Perdemos uma grande chance de avançar e atrair investimentos. O fato é que a nova Lei nº 14.133 também não enfrentou as principais causas que geram corrupção e, em meu ponto de vista, o tratamento que foi dado a esse aspecto só irá gerar maior insegurança jurídica aos contratantes e aos contratados’’, ressalta Lima Jorge.

Confira a seguir:

 

Como o senhor avalia os termos da nova lei de licitações recentemente sancionada pelo presidente da República?

No contexto geral nos chama atenção a questão das normas gerais de licitação. Existem diversos dispositivos que são chamados de normas gerais de licitação. Tudo o que é norma geral serve para as obras da União, estados e municípios. O primeiro problema que traz essa lei é que ela não esclarece com clareza o que são normas gerais e o que são as normas que podem ser aprimoradas pelos entes subnacionais. Continua, portanto, essa zona cinzenta da norma que passa a ser obrigatória ou não. Outro ponto é o período que se espera para a lei entrar em vigor, que é chamado vacatio legis. O que aconteceu de fato é que a lei postergou por mais dois anos a revogação da lei 8.666, de 1993, da lei 10.520, de 2002, chamada lei do pregão, e dos artigos primeiro até quarenta e sete da lei do RDC.  Nesses dois anos irão coexistir no país diversos diplomas legais, regulando as licitações públicas. E fica à escolha do administrador a lei que ele passa a seguir. Isso pode causar muito embaraço jurídico. É uma situação que passa para o administrador, quando a vigência dessa lei poderia ser definida a partir de dois anos. Isso garantiria um período de adaptação e um melhor conhecimento do administrador público. Não podemos esquecer que, além disso, existe a lei das estatais que tem disciplina obrigatória a ser seguida.

Mas há pontos positivos?

Sim. Por exemplo, a nova lei irá possibilitar maior transparência dos contratos por meio da criação de um portal nacional de contratação pública – sítio eletrônico oficial destinado à divulgação de todos os atos relativos às licitações e contratações públicas, de fácil acesso para qualquer interessado Outro ponto positivo é a obrigatoriedade de obras de grande vulto, de contratação integrada ou semi-integradas de disporem a matriz de risco no edital. Matriz de risco representa um grande avanço quando bem elaborado a fim de evitar a judicialização ou problemas de paralisação de contratos. Agora mesmo estamos vivendo, no país inteiro, um grave problema com os aumentos exacerbados de preços de material de construção que aconteceram na pandemia e as empresas estão na busca de um reequilíbrio econômico financeiro nos contratos. O contrato que já determina com maior clareza a questão do equilíbrio facilita a vida de todo o mundo, do administrador e da empresa. A maioria absoluta das obras públicas não tem e gera um impasse, no país todo, para se buscar esse equilíbrio econômico-financeiro. Essa obrigatoriedade de matrizes de risco se trata de um avanço pelo menos nas obras de grande vulto. Também trouxe um melhor regramento para consórcios, visto que essas modalidades estão bem discriminadas na lei. Também obriga uma série de justificativas e de análises, quando o administrador e os órgãos de controle determinarem a paralisação de contratos. Temos de se analisar agora diversos aspectos da questão, como quais os impactos sociais dessa paralisação, a questão do emprego, do meio ambiente, os  custos da desmobilização de canteiros de obras quando são paralisadas, por aí. Tem mais de onze itens que se tornam obrigatórios de análise para justificar uma ordem de paralisação de contrato. Assistíamos havia muito uma recomendação de órgãos de controle e isso bastava para que o administrador público, morrendo de medo, determinasse a paralisação do contrato. Aí se ficava dois, três anos examinando a questão e se percebia que os entraves poderiam ser sanados. Ocorre que aí a obra já estava havia muito parada. Agora existe um regramento melhor, antes que se determine qualquer paralisação de obra.

Como ficou essa questão do administrador público de ser responsabilizado por suas decisões?

É chamado “o apagão das canetas”, provocado pelo medo do administrador de informar o seu CPF em qualquer tipo de decisão. Agora a lei procurou dar uma garantia de assistência jurídica a esse administrador em caso de conflitos de licitações.

Outra novidade é o seguro-garantia que foi muito debatido. Essa questão foi bem resolvida?

Quando o projeto saiu do Senado para a Câmara, havia um entendimento que a melhor garantia para não se ter problema na execução de uma obra era exigir 100% do valor de contrato como garantia. Isso era uma prática que, além de excludente de inúmeras empresas, iria concentrar na mão de poucas empresas as licitações públicas, o que não interessava nem para as seguradoras que não tinham estrutura para isso. O setor e as próprias seguradoras foram discutindo isso quando o projeto de lei estava tramitando na Câmara dos Deputados e se concluiu a favor de um escalonamento dependendo do valor da obra. Até 30% nas obras de grande vulto, 10% nas de porte menor, 5% nas pequenas obras. Se a seguradora, no caso de haver problemas na obra, ela não quiser pagar o prêmio, ela pode assumir o controle do contrato, chamado step-in-right. Para isso, a seguradora terá acesso a todo o desenvolvimento da obra, como se fosse uma auditoria da obra. Mas há um problema sério porque as seguradoras não tem estrutura e nem dispõem de corpo técnico para fazer esse papel. Porque tem de ter corpo de engenharia. Para você  acompanhar a obra é preciso ter estrutura para isso. São coisas que no decorrer do tempo o mercado, inclusive o mercado das seguradoras, vai ter de dar resposta para isso. Eu acho que 30% do valor da obra é exagerado, mas quem acompanhou toda essa discussão que saiu do 100% do valor da obra para esse escalonamento, penso que conseguimos evitar o pior. Esperamos que isso não onere as propostas a serem apresentadas e muito menos gere reserva de mercado, porque cada seguro que você realiza para a execução de uma obra você tem o comprometimento da receita com aquilo. Vai diminuindo o teu potencial de pegar mais seguro. Esse exercício tem de verificar no mercado. As seguradoras terão de se preparar porque seguro garantia de obra nunca foi uma modalidade de grande atenção das seguradoras. Não era foco de receita. Tirando algumas grandes empresas que pela magnitude das obras, de grandes hidrelétricas, tinham uma atração para essa questão de seguro, no plano geral seguro garantia nunca foi modalidade que tenha recebido atenção das seguradoras.

Pelo jeito, no contexto geral, a lei ficou bem aquém da expectativa?

Tínhamos grande expectativa na lei o que, afinal, não aconteceu. A gente alertou. Tivemos muito trabalho para vetar um dispositivo, mas não conseguimos.  Trata-se de um conflito que está no dispositivo do artigo 29, que proíbe o pregão para obras de serviço de engenharia, e um que está no artigo 56, que obriga que as licitações de menor preço, que é a grande maioria de obras no país, sejam feitas pelo modo aberto. Ocorre que modo aberto e o pregão são exatamente a mesma coisa. Em resumo: um dispositivo da lei, no artigo 29, proíbe o pregão e outro dispositivo, no artigo 56, exige o pregão. É óbvio que isso irá resultar em conflito e irá judicializar algumas questões. Infelizmente, não conseguimos que esse dispositivo do artigo 56 fosse vetado.

Algum veto que causou surpresa?

Um veto que causou muita surpresa foi o parágrafo segundo do artigo 37. O fato é um dos principais problemas que o pessoal detecta em obras é a má qualidade de projetos. Depois de muitas discussões, ficou claro que o julgamento em caso de projeto teria que obrigatoriamente ser feito obrigatoriamente pelo padrão técnico ou técnica e preço, sendo que o aspecto técnico teria um peso de 70% e o preço, 30%. Isso foi vetado. O que isso significa?  Volta-se a essa cultura de contratar projeto pelo menor preço. E a gente tem infindáveis casos no Brasil de problemas devido à qualidade de projeto. Isso foi realmente um retrocesso muito grande esse veto a esse dispositivo.  No parágrafo quarto do artigo 115, outra questão que discutimos muito no Congresso e deveria ser mantido na lei, é o que envolve o licenciamento ambiental, que é o que mais gera atraso de obra. Hoje se leva até dois anos para dar início a obras, sobretudo às de maior porte, devido à questão do licenciamento. Havíamos conseguido nesse parágrafo quarto do artigo 115, que a licença prévia deveria ser obtida antes da divulgação do edital.  Ou seja, por ocasião da divulgação de um edital de licitação já era assegurada a licença prévia, de modo a evitar todo um transtorno posterior. Não se entende porque foi vetado esse artigo, dizem que contraria o próprio interesse público o que é um absurdo. E também outro grande avanço que tínhamos obtido, ainda mais com essa crise que todos os entes nacionais vivem, era de que qualquer ordem para início de serviço, ou etapa de obra, tinha de ser precedida de um depósito do mesmo valor em conta vinculada. É óbvio que quando eu autorizo alguém para fazer alguma coisa eu tenho que ter dinheiro para pagar. Pois ele também foi vetado sob o pretexto de que não precisa ter o financeiro para tocar a obra, basta ter o orçamentário. Meu Deus, isso é uma visão de gabinete de quem não conhece absolutamente um passo do que acontece na prática.

E sobre a segurança jurídica e a o combate à corrupção?

Por último, fico com muito receio de um capítulo inteiro de punições e penalidades, porque há muitos aspectos subjetivos. Não há clareza sobre o que pode gerar quatro ou cinco anos de reclusão, tanto para quem contrata quanto para quem é contratado. Isso vai trazer uma insegurança muito grande, principalmente para os administradores que já têm receio de decidir. Esse capítulo vai incentivar muito o fenômeno que a gente chama de apagão das canetas. Sinto que a lei poderia ter trazido muito mais avanços, tanto simplificador quanto de equilíbrio entre a responsabilidade de quem contrata e de quem é contratado. Perdemos uma grande chance de ter esse avanço.  Há uma grande frustração, pois se fosse acolhido pela lei e não vetado pela Presidência poderia dar equilíbrio e representar um avanço. Hoje com certeza lhe digo que o setor está frustrado e representa um retrocesso no instituto da licitação. Além de retardar os investimentos, a nova lei vai gerar mais insegurança, o que é muito ruim. Acaba se gerando uma lei que vai trazer judicialização, infelizmente.   O fato é que a nova lei também não enfrentou as principais causas que geram corrupção. No meu ponto de vista, o tratamento que foi dado a esse aspecto só irá gerar maior insegurança jurídica aos contratantes e aos contratados.

Veja a íntegra da entrevista na ‘Modal – Revista de Infraestrutura & Logística’.

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